segunda-feira, 16 de março de 2009

Conceito de Governo

DICIONÁRIO DE POLÍTICA

Governo

I. Definição. Numa primeira aproximação e com base num dos significados que o termo tem na linguagem política corrente, pode-se definir Governo como o conjunto de pessoas que exercem o poder político e que determinam a orientação política de uma determinada sociedade. É preciso, porém, acrescentar que o poder de Governo, sendo habitualmente institucionalizado, sobretudo na sociedade moderna, está normalmente associado à noção de Estado. Por conseqüência, pela expressão "governantes" se entende o conjunto de pessoas que governam o Estado e pela de "governados", o grupo de pessoas que estão sujeitas ao poder de Governo na esfera estatal. Só em casos excepcionais, quando as instituições estão em crise, o Governo tem caráter carismático e sua eficácia depende do prestígio, do ascendente e das qualidades pessoais do chefe do Governo.

Existe uma segunda acepção do termo Governo mais própria da realidade do Estado moderno, a qual não indica apenas o conjunto de pessoas que detêm o poder de Governo, mas o complexo dos órgãos que, institucionalmente, têm o exercício do poder. Nesse sentido, o Governo constitui um aspecto do Estado. Na verdade, entre as instituições estatais que organizam a política da sociedade e que, em seu conjunto, constituem o que habitualmente é definido como regime político as que têm a missão de exprimir a orientação política do Estado são os órgãos do Governo. O significado que a palavra Governo tem na língua italiana difere da que a palavra government tem nos países anglo-saxônicos. Com efeito, esta última significa, grosso modo, o que no continente europeu se designa com a expressão Regime Político e tem, portanto, uma acepção muito mais ampla do termo Governo, enquanto, para indicar o que nós entendemos com a palavra Governo, na língua inglesa se usam outros termos como cabinet na Grã-Bretanha e administration nos Estados Unidos.

Ainda que sob a influência do uso anglo-saxônico, em muitos estudos políticos publicados na Europa continental tem sido, também, freqüentemente usada a noção ampla do termo Governo, parecendo oportuno reenviar, para esse conceito, ao verbete Regime Político e definir o Governo na acepção mais limitada proposta antecedentemente, por estar mais de acordo com a linguagem corrente.

II. Origem histórica. Vimos acima que o termo Governo está habitualmente associado à noção de Estado. Ora, o Estado não é senão uma das formas que a organização política da sociedade assumiu no decorrer da história (a mais evoluída e a mais complexa), na qual se manifestou um poder de Governo. Se o Estado é um tipo de organização política relativamente recente (habitualmente sua origem se situa no início do século XVI), a formação de um poder de Governo remonta a uma fase histórica muito anterior. Por exemplo, a cidade-Estado e o Império feudal são formas pré-estatais de organização política, nas quais é possível identificar um poder de Governo.

A partir do momento em que a evolução da divisão do trabalho determinou, de um lado, a formação das relações sociais mais complexas das relações de parentela e, de outro, a consolidação de profundas desigualdades sociais entre os indivíduos e os grupos, criaram-se conflitos tão fortes que nasceu a necessidade de organizar a população sob o comando de um chefe, a quem se confiou a função de impor as regras necessárias para a produção e limitar os efeitos desagregadores de tais conflitos. Acontece assim, em seus termos mais gerais, a passagem da comunidade primitiva para a organização política da sociedade, na qual aparece uma primeira forma rudimentar de Governo.

Porém, o poder de Governo é tanto o resultado de determinantes internas, como de necessidades externas na comunidade política. Uma vez que o mundo sempre foi e ainda é, hoje, politicamente, dividido e dominado pela anarquia internacional, todo Governo deve assumir a defesa no confronto com as outras comunidades políticas. A concentração de poder nos órgãos do Governo constitui, portanto, o instrumento mais eficaz para enfrentar as exigências de segurança e de potência da comunidade política.

III. Função e estrutura do governo. Assim como em nenhuma comunidade se realiza jamais uma conformidade espontânea e automática às normas sobre as quais se funda o desenvolvimento normal e ordenado das relações sociais, em toda comunidade política existe um órgão que tem o cômpito de impor as regras de conduta e de tomar as decisões necessárias para manter a coesão do grupo. Esse órgão é o Governo. Por esse motivo, em todo o curso de evolução histórica da humanidade, a partir de uma determinada fase de desenvolvimento, em toda a sociedade se pode individualizar uma forma de Governo, entendido esse como uma forma de poder relativamente autônomo em relação aos vários grupos sociais, com a função específica de realizar a integração política da sociedade e a sua defesa no confronto com os grupos externos.

Contudo, pode-se dizer que um Governo é forte quando se baseia no consenso, enquanto que nenhum Governo poderia subsistir por longo tempo se tivesse que se impor pela força. Conquanto o liberalismo, a democracia e o socialismo tenham contribuído para o alargamento da base social do poder e tenham dado origem a um processo de humanização da vida política, o exército, a polícia, as prisões, etc., constituem ainda hoje o fundamento último em que se apóia o poder do Governo. A força e o consenso são, pois, as duas alternativas dialéticas que definem o Governo. São termos contraditórios que podem, no entanto, harmonizar-se numa situação, que jamais se realizou na história, a não ser como aspiração, onde a força se qualifique como autoconstrição da sociedade sobre si mesma, e, em conclusão, força e consenso tendam a confundir-se.

Ora, se a existência de um Governo central que detém o monopólio da força é indubitavelmente um aspecto típico do Estado moderno, e representa, portanto, o ponto de chegada de uma longa e complexa evolução histórica, o uso da força ou a ameaça de recorrer a ela foi sempre o meio específico que as autoridades de Governo tiveram à disposição para garantir a supremacia do seu poder.

Se agora nos propomos a especificar as determinações ulteriores do conceito de Governo em relação às funções do Estado, como lentamente se foram verificando no curso da história e como foram formuladas na doutrina da divisão de poderes, devemos afirmar que o Governo coincide com o poder executivo, ou melhor, com os órgãos de cúpula desse poder, com a execução do aparelho de funcionários, que tem a função de colaborar no funcionamento dos serviços públicos, dando execução às decisões do Governo, e que e a administração pública.

Da definição proposta se segue também que os órgãos legislativos e judiciários não fazem parte diretamente dos órgãos de Governo, ainda que esses exerçam seu poder em concorrência mais ou menos direta, mais ou menos ampla, segundo os casos, com os primeiros. Naturalmente, o fato de que tais órgãos concorram para o exercício do poder implica também que podem delimitar e controlar de qualquer maneira a ação do Governo.

No Estado moderno, o Governo se compõe normalmente do chefe de Estado (monarca ou presidente da república) e do conselho de ministros, dirigido pelo chefe de Governo. Nas repúblicas presidencialistas, o chefe do Estado é a figura proeminente. Em alguns tipos de federação, como nos Estados Unidos da América, o presidente reúne os poderes de chefe de Estado e de chefe de Governo. Assim, nas monarquias absolutistas, todo poder pertence ao monarca.

Mesmo se do ponto de vista constitucional o Governo é definido como órgão no qual se manifesta o poder estatal em toda a sua plenitude, do ponto de vista sociológico constata-se que nos Estados modernos, nos quais se realizam quaisquer das formas de participação eleitoral do povo, de forma mais ou menos livre, os centros de poder aos quais normalmente o Governo está subordinado (subordinado mas não de um modo absoluto nem mecânico, porque possui sempre uma relativa autonomia) são o partido ou a coligação de partidos de Governo. Nos regimes de partido único, o poder do Governo está nas mãos do chefe ou dos chefes do partido; nos regimes bipartidários, o chefe do Governo é habitualmente o chefe do partido de maioria; nos regimes pluripartidários, a designação do chefe de Governo nasce de um compromisso entre os partidos de coligação de Governo.

Por outra parte, pode acontecer que o poder de Governo esteja concentrado em parte ou no todo num grupo de tecnocratas da administração pública, de chefes militares, de chefes religiosos, etc., aos quais, segundo o esquema constitucional da divisão dos poderes, deveria ser tirado o poder de decisão política, pelo menos no que toca à administração pública e ao exército, que deveriam ter institucionalmente funções de execução e cujo papel, em qualquer caso, não deveria exceder o da pressão ou influência sobre os homens que estão no poder. Mas onde quer que se possa especificar a sede efetiva do poder de Governo, em toda a comunidade política, é possível identificar um conjunto de funções estáveis e coordenadas ligadas ao uso do monopólio da força, nas quais reside o poder de decidir de modo determinante a orientação política. Do ponto de vista da teoria da classe política, entendida como esquema classificatório dos comportamentos daqueles que dedicam a maior parte da sua atividade à política, os papéis de Governo constituem apenas uma parte da classe política, a cúpula da classe política de Governo, com exclusão da parte residual da classe política de Governo e da classe política da oposição.

Nenhum comentário:

Postar um comentário